sexta-feira, 29 de maio de 2009

DOMINGO DE PENTECOSTES: O NASCER DA IGREJA, NO ESPÍRITO SANTO.
( Reflexões extraídas do meu livro: "O Espírito Santo pede passagem".)

1. Na história do cristianismo, sempre se acreditou que a Igreja nasceu no dia de Pentecostes, isto é, com a vinda do Espírito Santo sobre os apóstolos. Esta constatação é de extrema importância por evidenciar que o Espírito possui, na Igreja, desde o início, um caráter institucional. Assim, a Igreja-Instituição não se baseia, como muito se pensou, na encarnação do Verbo, mas numa decisão dos apóstolos, inspirados e encorajados pelo Espírito Santo.
2. Ora, disto se compreende que, se a Igreja nasceu de uma decisão, então ela continuará a existir se os cristãos e os homens de fé no Cristo ressuscitado e no seu Espírito, renovarem continuamente esta decisão e encarnarem a Igreja nas situações novas que se lhes apresentarem, independentemente da cultura: grega, medieval ou atual. Deste modo, a Igreja não se pode impor como uma grandeza completamente estabelecida e definida, mas como uma realidade sempre aberta a novos encontros situacionais e culturais e, dentro destas realidades mutantes, deve encarnar e anunciar, de modo compreensível, a mensagem libertadora de Cristo.
3. É a partir desta compreensão e, somente dela, que devemos pensar a realidade da Igreja. Ela deve ser buscada, não mais a partir do Jesus carnal, como aconteceu no passado, mas a partir do Cristo ressuscitado, existindo agora na forma de Espírito. Contudo, não apenas o Espírito Santo como a terceira pessoa da Trindade, mas como a força, a energia e o modo de atuação mediante o qual o Senhor permanece presente na história e continua a sua obra no mundo. Só assim é que podemos dizer que a Igreja é o sacramento, sinal e instrumento do Cristo ressuscitado, no aqui e agora da nossa história.
4. Nesta perspectiva, se a atual presença de Cristo no mundo, através do Espírito Santo, não conhece mais limitações e obstáculos, então, seu corpo, que é a Igreja, não se pode também enclausurar nos limites de suas verdades próprias, de sua dogmática, do seu catecismo, de seus ritos, de sua liturgia, de suas normas e leis e do seu direito canônico.
5. Isto equivale dizer que, as instituições eclesiásticas, somente se estiverem abertas a um contínuo aperfeiçoamento, mudança e adaptação aos novos tempos, é que podem ser um serviço autêntico ao mundo. Caso contrário, correm o risco de tornarem-se redutos de conservadorismo e instrumentos de opressão que bloqueiam o desenvolvimento libertador da graça e da fé. Assim, todas as instituições e mecanismos de Igreja são chamados a ser sacramentos a serviço do Espírito, pelos quais o ressuscitado atua hoje e faz-se presente na visibilidade histórica da humanidade. De outro modo, se enrijecerem demais e recusarem-se à funcionalidade dinâmica desta fé e desta graça, podem tornar-se um contra-testemunho do reino e da presença do ressuscitado no mundo.
6. Concluímos que, da Igreja só podemos falar a partir da chegada do Espírito Santo, em pentecostes. Ela é um acontecimento fundamentalmente do Espírito. Espírito que, primeiro, ressuscitou Jesus dentre os mortos, transformando-lhe a existência carnal em existência espiritual; e, depois, desceu sobre os doze para fazê-los apóstolos, fundadores da comunidade eclesial. Igreja, neste sentido, é mais um acontecimento primordial do que propriamente uma instituição com todos os seus bens, serviços, leis, doutrinas e ministérios constituídos. Aliás, nunca é sobre a Igreja que nos devemos apoiar, e sim, sobre aquilo que constitui o seu próprio apoio e sua real força: o Espírito. A referência última, portanto, deixa de ser a Igreja ou seus modelos e passa a ser o Espírito de Deus que age no mundo, ao qual ela é, incessantemente, chamada a converter-se.
7. Isto tudo nos permite afirmar que, pela força do Espírito, todos os seres humanos e, com mais razão, todos os cristãos, somos chamados a ser a mais recente edição de Jesus Cristo na face da terra. Uma edição totalmente nova, revisada, ampliada e atualizada, capaz de responder às exigências e desafios próprios do tempo presente. É nesta consciência e somente nela que o Cristo poderá permanecer vivo e atuante no coração do ser humano e no coração do mundo. Eis o verdadeiro pentecostes.
8. Ou seja, por meio da missão do Espírito, a humanidade reinventa a ação de Cristo, a seu modo, múltiplo e diverso, em todos os recantos do tempo e do espaço, a fim de formar uma grande ação, uma única história. O Espírito é, por natureza, um criador de diversidades. Sua ação é múltipla e seu papel consiste em multiplicar a ação de Cristo, conforme a extensão da diversidade humana. O Espírito reinventa e cria. Nossas ações são novas criações. E é sob o olhar do Espírito que elas, por assim dizer, retomam e dão continuidade à ação de Jesus Cristo. Na verdade, não existe um modo específico de uma pessoa, hoje, se parecer com o Cristo, tal como Ele se mostra nos evangelhos. Cada qual imita tanto melhor o Cristo, quanto mais for original na criação do seu próprio modelo e no exercício pleno de sua unicidade.
9. Neste ponto, fica claro que o Espírito Santo é enviado para fazer-nos agir. Suas ações são nossas ações. Ele não tem ações próprias, tem apenas as nossas. Com isto, nossas ações tornam-se ações do Espírito de Deus. Todavia, nós não agimos a partir de nós mesmos, mas a partir da ação que é o Espírito, que concebe a ação antes de nós, colocando-a em movimento.
10. Sem dúvida, sabemos que nossas ações são sempre limitadas pelo nosso corpo e pela nossa inserção no mundo. Mas elas não são, apenas, reflexo deste contexto ou destes limites. Muito mais que isto, podem ser inteiramente explicadas por sua fonte, pela energia ilimitada, pelo esforço infatigável e o movimento infinito do Espírito, que é a ação por excelência, animadora de toda ação.
11. Esta missão do Espírito teve início na vida terrestre do Jesus histórico e desabrocha continuamente na ação da humanidade como um todo e na ação de cada um de nós, em particular, que refaz a história a cada instante.