quinta-feira, 27 de agosto de 2009

XXII DOMINGO COMUM (Mc 7, 1-8.14-15.21-23)

Neste evangelho de hoje, os fariseus e os doutores da lei são os nossos pedagogos. Eles nos ensinam como não devemos viver a vida; nos ensinam, portanto, com os seus erros. E aqui está uma primeira e importante lição: observar os erros dos outros, não para criticá-los, e sim, para não reproduzi-los em nossas vidas. Nesta perspectiva, resta-nos perguntar: de quais erros dos fariseus estamos falando? Eis alguns deles:
1º) Realçar sempre os defeitos das pessoas e nunca as suas qualidades.
Ora, sabemos muito bem que quando queremos encontrar defeitos numa dada pessoa, para criticá-la por causa deles, facilmente os encontramos. Basta procurá-los. Afinal, como bem diz o ditado popular: quem procura, acha. Entretanto, creio não ser este o melhor caminho para se ajudar alguém. Aliás, não conheço, pessoalmente, ninguém que tenha melhorado como pessoa, pelo fato de ter sido criticado ou corrigido ou, menos ainda, por ter sofrido algum tipo de humilhação por conta dos seus erros. Ao contrário, o que percebemos, em geral, é que ninguém gosta de ser criticado, mesmo dizendo que sim. E quando alguém usa aquele conhecido "chavão" de que aceita quaisquer críticas, desde que sejam construtivas, como a expressão "crítica construtiva" é muito subjetiva, é a mesma coisa que dizer: longe de mim com suas críticas. Por outro lado, é sempre bom lembrar que, na maioria das vezes, quando criticamos recorrentemente as pessoas, no fundo, estamos criticando a nós mesmos, aos nossos próprios defeitos não reconhecidos, não aceitos, não assumidos e, por isto mesmo, projetados nos outros. A sabedoria popular já diz que "quando apontamos um dedo contra alguém, têm pelo menos três outros apontando contra nós". No mais, já está provado e comprovado que ninguém muda ou corrige ninguém. Toda mudança verdadeira é fruto de uma caminhada pessoal, de um desejo, uma convicção, uma tomada de consciência.
2º) Viver obcecados pela limpeza, ordem e organização das coisas.
Ora, todos sabemos o quanto tais conceitos são relativos mediante pessoas e circunstâncias diferentes. Assim, muitas vezes, o que é limpeza para um, pode não o ser para outro; o que é ordem e organização na nossa visão, pode ser, inclusive, visto como desordem na perspectiva de outrem. Eu mesmo sou exemplo disto: na minha mesa, para quem olha de fora, há sempre uma certa desorganização. Entretanto, sempre sei onde encontrar cada coisa que nela está e, muito provavelmente, se alguém que não seja eu próprio, tentar arrumá-la, terei dificuldades para encontrar as coisas quando delas precisar. É o que costumamos chamar de "bagunça organizada". Querendo ou não, é assim que as coisas funcionam. Por outro lado, hoje já se sabe, segundo estudos de especialistas, que um pouco de poeira, de sujeira ou de "bagunça", numa justa medida, não faz mal a ninguém. Pelo contrário, pode, até mesmo, ajudar a criar uma certa imunidade e melhorar as nossas defesas, sobretudo nas crianças. Controvérsias à parte, o que quero dizer, na verdade, é que a limpeza, a ordem e a organização devem ser vistas sempre como um meio, um canal, um instrumento, e nunca como um fim em si mesmas. Trata-se, portanto, de verdades relativas que exigem de nós o máximo de respeito ao modo diverso com que as pessoas as concebem e as experimentam.
3º) Valorizar excessivamente os detalhes, as minúcias e os pormenores, perdendo a visão do conjunto, da totalidade.
O exemplo do evangelho é claríssimo: os fariseus estão com Jesus, mas não vêem Jesus; vêem as mãos dos discípulos. Isto nos adverte seriamente para as vezes nas quais nos perdemos em coisinhas miúdas, em bobagens ou detalhes insignificantes da vida e desviamos o nosso foco daquilo que realmente importa, das coisas valiosas e verdadeiramente fundamentais. Trata-se, aqui, da necessidade de darmos prioridade ao que de fato é prioritário na nossa vida. É hora de se perceber que a coisa mais importante da vida não é coisa, é gente; não é a nossa casinha arrumadinha, limpinha, bonitinha... mas, as pessoas que estão conosco. Acontece que, muitas e muitas vezes, somos impecáveis com as coisas e erramos redondamente com as pessoas. Por causa disto, muitos relacionamentos ficam comprometidos. Está na hora de mudarmos esta equação: se tivermos de errar, erremos com as coisas, mas, pelo amor de Deus, acertemos com as pessoas.
4º) Repetir o que fizeram os seus antepassados.
Os fariseus perguntam a Jesus por qual razão os discípulos dele não seguiam a tradição dos antigos. A resposta de Jesus não poderia ser mais clara: a tradição dos antigos serve para os antigos. Isto significa dizer que devemos ser capazes de deixar o passado no passado (ainda que este seja importante enquanto referência) e aceitar que o presente é distinto; não é melhor nem pior, mas é diferente. O que os nossos antepassados disseram ou fizeram no seu tempo, não nos oferece qualquer garantia de que seja oportuno de dizer ou fazer no nosso tempo. Neste sentido, foi o próprio Cristo quem nos disse: "Vocês farão coisas maiores do que as que faço". Aliás, não viemos ao mundo para repetir ninguém. Viemos aqui para fazer a diferença e se não o fizermos, teremos perdido a nossa viagem.
5º) Fazer a coisa certa do jeito errado.
Jesus diz: "Esse povo me honra com os lábios, mas o seu coração está longe de mim". Isto me faz lembrar o que dizia uma mente lúcida dos nossos tempos: "A maior distância a ser vencida por um ser humano é aquela entre a cabeça e o coração". Creio que seja a mais pura verdade. Na maioria das vezes, é mais fácil percorrer o mundo inteiro do que cumprir este itinerário. O poeta Jimenez já advertia: "Não corras, não tenhas pressa. Afinal, aonde tens de ir é somente a ti". Deepak Chopra, médico e escritor indiano radicado nos Estados Unidos, também nos falava que "nós já somos o que nós procuramos". Por fim, um monge e escritor de inspiração budista, Jack Kornfield, numa das suas principais obras, intitulada "um caminho com o coração", afirma que não importa o caminho que escolhemos para percorrer na nossa vida; o que importa, de verdade, é saber se no nosso caminho há um coração. Enfim, são lições de ontem e de hoje que podem e devem ser utilizadas por cada um de nós, em busca de uma maior inteireza e coerência de vida, fator essencial para quem deseja encontrar felicidade nesta vida e por todo o sempre.