sábado, 23 de maio de 2009

DOMINGO DA ASCENSÃO ( Mc 16, 15-20 )


1. A Ascensão de Jesus é como se Ele nos quisesse dizer claramente:"O meu tempo acabou. Cumpri minha missão. Agora, eis que é chegado o tempo de vocês. Vivam-no e cumpram nele a missão que lhes é confiada". Isto significa que Cristo saiu de cena para que nós pudéssemos entrar em cena. A sua ausência física no mundo se converte em presença espiritual, através de cada um de nós. Então, a partir da Ascensão, mais apropriado do que perguntarmos por Deus, é perguntarmos sobre nós; antes de querermos saber sobre a ação de Deus, procuremos ver as nossas ações.
Quanto ao evangelho de Marcos, o aspecto que merece relevância no texto, refere-se aos sinais concretos que acompanharão os que acreditarem, segundo as palavras do próprio Jesus. São eles:
1º) "Expulsarão demônios em meu nome" - Sabemos que a possessão demoníaca, segundo a tradição, é o símbolo mais contundente da alienação humana. Uma pessoa possuída era aquela que havia perdido a sua auto-determinação, sua liberdade, seu domínio. Enfim, o possesso era aquele que se havia perdido de si mesmo, à medida que se deixava conduzir por outras forças, por outras vontades, por outros espíritos.
Podemos dizer que, hoje, os verdadeiros possessos somos todos nós, quando vivemos, simplesmente, para dar satisfação aos outros ou para responder a expectativas alheias, sacrificando nossos próprios valores e negligenciando nossa própria consciência. Sendo assim, expulsar demônios significa ter a capacidade e a coragem de superar este nível fácil e superficial das críticas e dos aplausos; superar a tentação de querer agradar a todos e alcançar, com isto, o reconhecimento de todos. É saber que mais importante do que nossa reputação é o nosso coração, nossa motivação interior, nossa consciência cristã, nossa fé.
2º) "Falarão novas línguas" - Falar novas línguas é a imagem que nos fala mais e melhor da abertura de espírito, de uma mente arejada, do respeito aos outros e ao diferente e de uma atitude mais inclusiva e acolhedora de tudo e de todos. Ou seja, o discípulo de Cristo é aquela pessoa capaz de incluir todas as outras pessoas, na sua pessoa; todas as culturas, na sua cultura; todas as religiões, na sua religião. Em outras palavras, falar novas línguas, é sermos capazes de não excluir nenhuma experiência humana da nossa própria experiência. Trata-se da necessidade de aprendermos a crescer com tudo e com todos, deixando de lado tanto o apego quanto a aversão. Além do mais, falar novas línguas é sermos capazes de romper com as nossas idéias fixas e de abandonar nossas opiniões pessoais, em nome de causas maiores; sair das nossas clausuras psíquicas, culturais e religiosas, para melhor interagir com todos os outros. Afinal, nenhuma opinião, por mais acertada que seja, contém toda a verdade e, ainda, todo ponto de vista é sempre a vista de um ponto. Logo, os discípulos de Cristo são aqueles que sabem ser flexíveis, includentes e nunca intransigentes.
3º) "Se pegarem em serpentes ou beberem algum veneno mortal, não sofrerão nenhum mal" - Esta imagem nos serve para mostrar que os verdadeiros discípulos de Cristo, ainda que, à semelhança de todos os outros homens e mulheres, vivam igualmente expostos aos riscos, perigos e maldades do mundo, são chamados a construir uma espécie de imunidade espiritual, uma energia nova, embasada na fé e capaz de protegê-los contra os males indesejáveis e os muitos "venenos" deste mesmo mundo. É aquilo que, na perspectiva das religiões de origem africana, é conhecido por "fechar o corpo". Esta característica é encontrada, tão somente, naqueles que aprenderam a confiar e sabem deixar-se conduzir pela força inabalável dAquele em quem depositaram a sua confiança: Deus.
4º) "Quando impuserem as mãos sobre os doentes, eles ficarão curados" - Trata-se aqui, da necessidade de aprendermos a utilizar nossa energia corporal e nossa presença física como fonte e instrumento de bem-estar para com todas as pessoas com quem contactamos. Assim, o verdadeiro discípulo de Cristo é aquela pessoa capaz de ser uma presença redentora na vida das outras pessoas: de leveza, serenidade, alegria, ânimo, entusiasmo, encorajamento e libertação. E isto é muitíssimo importante se levarmos em conta que, na maioria das vezes, nossa presença física junto às pessoas, não tem sido das melhores. Ao contrário, tem-se revelado pesada e portadora de inconveniências, de abusos, de maus-tratos, de más notícias, de sofrimento, de perturbação e de toda espécie de mal-estar. São Paulo já nos falava, com muita precisão, que nosso corpo é templo do Espírito Santo e instrumento para levar Deus ao mundo. Entretanto, podemos convertê-lo (e assim o temos feito) em templos de espíritos nada santos e instrumentos de tudo, menos de Deus. É chegada a hora, creio eu, de adequarmos o nosso corpo à sua finalidade original, à sua vocação divina. Oxalá que o possamos fazer, antes que seja tarde!