segunda-feira, 23 de março de 2009

V DOMINGO DA QUARESMA (Jo 12,20-33)


1. "Filipe e André conduziram até Jesus alguns gregos que gostariam de conhecê-lo" - Sabemos que os seres humanos são, por natureza, carentes de mediações e de mediadores, de coisas e de pessoas que os ajudem a chegar a outras coisas e a outras pessoas. Nesse sentido, tudo na vida está ligado a tudo e tudo está em evolução contínua. Ou seja, o que fazemos agora nos prepara ou não para o que temos de fazer depois; os nossos relacionamentos de hoje, nos abrem ou nos fecham as portas para os de amanhã. Na verdade, por mais que desejemos fazer as coisas de forma rápida, imediata e direta, temos sempre que superar obstáculos, cumprir etapas e aprender a lidar com muitos e diversos meios para alcançar os fins almejados. Aliás, eu desconfio, sinceramente, de que não estamos aqui na terra para alcançar fins determinados, e sim, para sermos felizes no meio do caminho, no aqui e agora da vida, com o que dispomos neste exato momento da nossa existência.


Vejam esse exemplo, de algo que me aconteceu: Certa vez, eu viajei de Crato a Fortaleza (530kms) para resolver uma questão do Centro Social da paróquia em que estava como pároco, junto a um órgão do governo federal. Lembro-me de que somente dispunha de um dia para tentar resolver tudo e voltar à minha terra. Carregava comigo um certo temor, pelo fato de não conhecer ninguém daquela entidade com quem eu pudesse falar e, quem sabe, por esse meio, agilizar o processo. Chegando ao balcão de atendimento, qual não foi a minha surpresa quando o funcionário olhou-me e cumprimentou-me com um largo sorriso no rosto, enquanto foi logo dizendo que já me conhecia e que me era eternamente grato por eu ter visitado a senhora sua mãe, no momento em que ficou viúva, anos atrás, em Crato. Na sequência, ouviu a minha questão e, logo, conduziu-me ao seu chefe. A verdade é que, em menos de uma hora, tudo já estava resolvido e pude voltar para casa, conforme o planejado. Melhor não podia ter sido. Conclusão: Precisamos fazer bem todas as coisas que temos para fazer hoje e precisamos tratar bem todas as pessoas com quem nos relacionamos a cada momento. Afinal, elas poderão ser pontes que nos ligarão a outras coisas e a outras pessoas, num futuro próximo da nossa caminhada, na hora que mais necessitarmos.


2. Jesus fala da sua morte, dizendo:"Chegou a hora em que o Filho do Homem vai ser glorificado". Aqui, temos, nas palavras de Jesus, uma nova compreensão sobre a morte. Ou seja, a morte deixa de ser uma tragédia, algo absurdo e indesejável ou o fim de tudo e passa a ser uma necessidade imperativa, uma condição sem a qual o ser humano não se realiza. Neste sentido, a morte passa a ser um meio indispensável e insubstituível para realizar o verdadeiro propósito da vida. Assim, permitir que as pessoas morram, ao chegar a sua hora, é uma das maiores expressões de amor para com elas. Igualmente, aceitar a nossa própria morte é o maior gesto de amor para conosco, uma vez que, somente com a morte, é que alcançaremos plenitude, glorificação e frutificação, seguindo o exemplo do grão de trigo caído na terra.


3. "Quem se apega à sua vida, perde-a; mas quem faz pouca conta da sua vida neste mundo, conserva-la-á para a vida eterna". Aqui, Jesus nos faz um alerta bastante contundente sobre a tentação muito humana do apego. E a razão para tal, é a seguinte: Nessa vida, tudo muda a cada instante, tudo passa rapidamente. Logo, o segredo da felicidade para nós, é aprendermos a mudar com o que muda, passar com o que passa e abrir-nos para a novidade de cada momento. Só assim, poderemos, quem sabe, conhecer e criar espaço, em nossas vidas, para o que permanece realmente. A questão, na prática, é: Estamos preparados para as mudanças na nossa vida? Vocês, os casados, estão preparados para perder o marido ou a esposa, ou os filhos? Vocês, os saudáveis, estão preparados para uma grave doença? Vocês, os ricos, já estão a contar com a possibilidade de perder tudo o que têm? O fato é que, quase nunca, nos preparamos para as mudanças radicais e, por isso mesmo, é que sofremos tanto, quando elas batem à nossa porta.
Aqui, compreendemos a sabedoria dos antigos que diz: "Se queres a paz, prepara-te para a guerra". Ou seja, devemos sempre fazer algo, nos preparando para o seu oposto, uma vez que, mais cedo ou mais tarde (por vezes, mais cedo do que mais tarde) tudo mudará. Jesus nos pede que não nos apeguemos a nada e a ninguém. Todavia, o desapego não é algo que acontece por livre e espontânea geração; ele é fruto de um treinamento, de um exercício. Trata-se da gente aprender a nadar antes de cair nas águas violentas de um rio; pois, se acontecer de cairmos nelas antes desse aprendizado, será muito difício sair de lá com vida. E, infelizmente, é isto que nos têm acontecido, via de regra.


4. "O que direi? Pai, Livra-me desta hora? Mas, foi precisamente para esta hora que eu vim". Com estas palavras, Jesus nos ajuda a compreender, de uma vez por todas, a nossa tarefa no mundo. Não estamos aqui para nos livrar do sofrimento, da dor e da morte, e sim, para aprender com eles. Assim como, não estamos aqui para tapar todos os buracos de todas as estradas por onde passamos, e sim, para passar bem pelas estradas, apesar dos seus muitos buracos e, talvez, por causa deles mesmos. Na vida, sempre haverá estradas esburacadas à nossa frente. Como passamos por elas, depende de nós. E aqui reside o sentido de toda a caminhada. As dificuldades da vida existem para todos e em todos os setores, a fim de que possamos desenvolver os nossos potenciais e a nossa sabedoria, em busca de superação. Logo, ao invés de dizermos: "Pai, livra-me dessa hora", diremos, conscientemente: "Pai, glorifica o teu nome".


5. "É agora o julgamento deste mundo". Jesus aqui nos adverte quanto à importância do momento presente, e não do passado ou do futuro. Tudo de que dispomos na nossa vida, é esse momento. Portanto, o que tivermos de fazer precisamos fazer agora. Fora do agora não há felicidade possível. Isto significa dizer que, o momento atual não é, simplesmente, um meio para se chegar a um fim; ele já é um fim em si mesmo.

Esta mensagem é extremamente oportuna para aqueles de nós que costumamos adiar sempre a nossa felicidade para um tempo num futuro próximo ou distante: amanhã, semana que vem, no outro mês, no outro ano, quando eu terminar meu curso, quando meus filhos crescerem, quando o salário melhorar, quando esta crise acabar, etc. Ora, preciso ser feliz agora e somente agora, ainda que meu curso não tenha acabado, que meus filhos sejam pequenos, que meu salário seja baixo e que as crises da vida insistam em bater à minha porta. Afinal, ninguém se engane: amanhã poderá ser tarde demais. Como dizia um grande sábio: "Amanhã ou a eternidade? Nunca se sabe o que vem primeiro". Portanto, apostemos no hoje.