terça-feira, 28 de abril de 2009

IV DOMINGO DA PÁSCOA (Jo 10, 11-18) - DIA DO BOM PASTOR.

1. "Naquele tempo, disse Jesus: Eu sou o Bom Pastor".
A imagem do Bom Pastor, no evangelho de João, vem lembrar-nos sobre o pastor que há dentro de cada um de nós, o líder que cada qual carrega consigo. Querendo ou não, todos nós viemos ao mundo para liderar. Quem não lidera, não cumpre a sua missão, nem como ser humano e, menos ainda, como cristão. Portanto, somos chamados por Deus a ser pastores de ovelhas, a conduzir um rebanho e a ser protagonistas da nossa história, fazendo a diferença, através da nossa atitude testemunhal.
Porém, o verdadeiro líder é aquele que, antes de mais nada, aprendeu a liderar a si mesmo: seus pensamentos, sentimentos, impulsos, vontades, desejos, etc. Quem de nós é capaz de levar tudo isso sob controle? Trata-se, aqui, de sabermos que aquilo que pretendemos ser para os outros, precisamos ser, antes, para nós mesmos. E isto, por uma razão muito simples: ninguém dá o que não tem. Em outras palavras, se quero o bem dos outros, preciso estar bem comigo; se quero um mundo de paz, preciso ter um coração apaziguado; se quero colocar ordem no mundo, preciso estar em ordem.
Neste sentido, o líder não é, necessariamente, o político, o empresário ou o sacerdote, como geralmente pensamos. Ao contrário, estas pessoas, via de regra, lideram pelo poder, pelo dinheiro ou pela função que ocupam; e se não tiverem cuidado, não passarão de mercenários. Afinal de contas, sabemos que é imensamente mais fácil liderar e vencer os outros do que exercer essa liderança sobre nós próprios, superando nossas muitas barreiras e limitações pessoais.
2. "Conheço as minhas ovelhas e elas me conhecem".
O verdaeiro líder é aquele que, por um lado, se conhece e, por outro, se dá a conhecer; até porque, hoje, sabemos que todo conhecimento autêntico tem como pressuposto indispensável o auto-conhecimento. Isto significa dizer que quem conhece tudo, mas não se conhece, ainda não conhece nada; é um ignorante, um analfabeto, mesmo que apresente um título de doutor. Aliás, no nosso contexto, uma pessoa pode se tornar, facilmente, um PhD, um pós-doutor, continuando a ser um analfabeto emocional, um bárbaro da subjetividade, um bruto nas coisas da alma. Portanto, o maior e mais importante investimento que alguém poderá fazer, no momento atual, não é na bolsa de valores, no mercado imobiliário ou nos ganhos da caderneta de poupança. A alma é o melhor negócio, o maior e melhor investimento. Inclusive, a médio e longo prazo, é o mais rentável também. Afinal, como indagava Jesus: "De que adinta você ganhar o mundo inteiro, se você se perdeu de si mesmo"?
3. "Tenho ainda outras ovelhas que não são deste redil: também a elas devo conduzir".
Ora, que fique bem claro, de uma vez por todas, que Deus não é propriedade privada de nenhuma religião, de nenhuma igreja. As suas ovelhas são as ovelhas de todos os currais, de todas as pastagens, de todas as tradições religiosas e, também, das que estão fora de tudo isso. Deus nunca assinou um contrato de exclusividade com nenhuma igreja. Ele se encontra em todas elas e, ao mesmo tempo, acima de todas. Nesta perspectiva, não devemos enxergar as religiões como sendo, necessariamente, opostas umas às outras. Mais acertado é aceitá-las como realidades complementares, na medida que representam o esforço do conjunto da humanidade, para chegar até Deus, por diferentes caminhos. Assim sendo, as religiões podem ser vistas como respostas, culturalmente situadas, ao chamado à felicidade, que Deus faz a todos os seres humanos, indistintamente. Porém, refiro-me, aqui, a religiões e não a seitas; pois, como o próprio nome já indica, são sectárias e caminham fora da comunhão. Para que se entenda melhor, imaginemos uma folha branca com inúmeros pontinhos pretos; cada ponto representando uma religião existente. Ora, por mais que haja pontos pretos nesta folha, a parte branca ainda é maior. Deus é sempre maior.
4. "Todos escutarão a minha voz e haverá um só rebanho e um só pastor".
Isto equivale a dizer que, o critério de pertença a Deus não é nossa pertença a uma dada religião, e sim, nossa atitude de escuta verdadeira à voz desse Deus que nos fala continuamente, bem como, nossa real atenção à sua presença no concreto das nossas vidas. Infelizmente, vivemos num tempo em que se perdeu a escuta, o silêncio, a profundidade. E, como não escutamos, não compreendemos e, por não compreendermos, não interpretamos bem e, por não sabermos interpretar, transformamos a nossa vida num verdadediro caos. E, a propósito, é bom não nos esquecermos de que, na vida, a única crise intolerável é aquela que não sabemos interpretar.
Desse modo, não podemos jamais conhecer a fé de uma pessoa pela religião dessa pessoa ou pela explicitação externa de sua religiosidade. A fé é um dom divino que se faz acompanhar, sempre, por uma atitude testemunhal, por uma forma toda particular de ser o que somos. Recordo, agora, a resposta que deu o Dalai Lama a um repórter que lhe perguntou qual era a melhor religião. Disse ele: "A melhor religião do mundo é aquela que faz de você uma pessoa melhor".
5. "Dou a minha vida, para depois recebê-la novamente".
O líder verdadeiro é aquele que sabe viver a harmonia dos contrários. Ou seja, sabe dar e sabe receber, abrir as mãos e fechá-las, rir e chorar, endurecer e flexibilizar, segurar e soltar, comer e jejuar, falar e calar, entregar-se e retomar-se, e assim por diante. Isto é de uma importância sem tamanho, uma vez que, na vida, quase sempre aprendemos a andar por um lado só, quando, na verdade, todos os lados são igualmente necessários.
6. "Ninguém tira a minha vida, eu a dou por mim mesmo".
A grande lição destas palavras é que, paradoxalmente, as únicas coisas que não perdemos na vida, são aquelas que doamos. No mais, todas as outras que desejamos reter e segurar conosco, nos serão tiradas, mais cedo ou mais tarde. E, por vezes, mais cedo do que mais tarde. E o segredo para se entender essa verdade, é simples: aquilo que doamos, não nos pertence mais. Logo, já não podemos perder. E isto vale para todas as coisas, inclusive, para a nossa própria vida. Portanto, se quisermos ganhar a nossa vida, precisamos ser capazes de entregá-la a uma causa, um ideal, um projeto, um sonho... a algo que seja maior do que nós mesmos. E façamos isto, antes que a morte venha e ponha tudo a perder. Será uma pena, a maior pena, a única pena!