sábado, 19 de setembro de 2009

XXV DOMINGO COMUM (Mc 9,30-37)

1. "Jesus e os seus discípulos caminhavam através da Galiléia e Jesus não queria que ninguém soubesse, porque estava ensinando seus discípulos".
Vemos, aqui, que Jesus ensinava a seus discípulos e o fazia numa circunstância bastante específica, ou seja, enquanto caminhava com eles. Mais uma vez, o evangelho nos mostra que somos chamados a ter contato e tomar conhecimento sobre as verdades fundamentais da vida, enquanto estamos a caminho, ou seja, à medida em que a vida vai acontecendo, no aqui e agora da nossa existência, no tempo e no lugar que nos encontramos, presentemente; e não, num tempo qualquer do futuro ou num outro lugar diferente daquele no qual estamos agora. Afinal, é caminhando que se aprende a caminhar, é vivendo que se aprende a viver. Por outro lado, todas as pessoas que caminham conosco e aquelas outras a quem encontramos no nosso caminho, existem para nos ensinar alguma coisa. Todas elas encarnam, a seu modo, a presença do próprio Cristo-Mestre em nós, inclusive, nos detalhes e pormenores do nosso dia-a-dia. Assim, talvez, sejamos capazes de perceber, por exemplo, que o motorista imprudente ou o adolescente respondão estejam aqui para ensinar-nos a ter paciência; bem como, o jovem punk, com seus cabelos coloridos e empinados, esteja aqui para ensinar-nos a não fazer julgamentos apressados, e assim por diante. Nossa tarefa é procurar saber, o mais possível, o que as pessoas estão nos ensinando, a cada momento da vida. Se fizermos isto, no mínimo, nos sentiremos menos aborrecidos, incomodados e decepcionados pelas ações e imperfeições alheias. Em geral, quando descobrimos o que os outros, direta ou indiretamente, estão tentando nos ensinar, torna-se fácil livrar-nos da frustração. Suponhamos, em mais um exemplo, que estejamos em uma agência bancária e que o atendente do caixa pareça estar propositalmente trabalhando bem devagar. Em vez de nos sentirmos incomodados ou com raiva, perguntemos: "O que ele está tentando me ensinar?" Talvez seja a complacência, ou a paciência, ou a tolerância ou, quem sabe, os três juntos. Portanto, enfrentar uma fila é uma excelente ocasião para o aprendizado. Logo, tudo que precisamos fazer é mudar nossa percepção e, ao invés de perguntar: "Por que estão fazendo isso?", perguntemos: "O que estão tentando me ensinar com isso?". Os resultados serão totalmente distintos.
2. "E dizia-lhes: O Filho do Homem vai ser entregue às mãos dos homens e eles o matarão. Mas, depois de três dias, Ele Ressuscitará".
Ora, por qual motivo Jesus sempre fala aos discípulos sobre o sofrimento e a morte que estão por vir? Talvez, pelo fato de serem eles, paradoxalmente, nossos melhores mestres. Aliás, por mais que evitemos falar e nos desviemos destes assuntos difíceis, chega um tempo que isto não mais é possível e precisamos começar a pensar sobre eles, criar coragem e enfrentar a realidade nua e crua. Portanto, não devemos fugir do sofrimento ou temê-lo, pois, como diziam os antigos: "O sofrimento é uma necessidade. Precisamos dele para o nosso crescimento e para a construção da nossa maturidade hamana." Assim sendo, todo sofrimento tem uma lição a nos ensinar. Quando assimilamos esta lição, o sofrimento tende a cessar. Todavia, enquanto não o fazemos, ele tende a permanecer e a se repetir continuamente. Há uma prece tibetana que diz: "Senhor, fazei-me capaz de receber as dificuldades e os sofrimentos próprios deste dia, a fim de que o meu coração seja verdadeiramente despertado". Há, também, uma poesia persa assim traduzida: "Agradece a quem, por qualquer razão, te maltrata; pois, assim, te faz retornar ao espírito. Porém, preocupa-te com aqueles que te oferecem bem-estar; pois, assim, te afastam da prece". Martin Luther King, ativista negro pelos direitos civis dos afro-americanos, no auge do sofrimento e perseguição que experimentou, dizia: "Não peço a Deus que me livre do sofrimento. Peço que me faça vencer o sofrimento pela capacidade de sofrer". Infelizmente, vivemos hoje numa sociedade que deseja banir, a todo custo, o sofrimento. Somos uma geração de comodistas; formados, via de regra, para não suportar o menor incômodo. Porém, não se pode evitar ou destruir o inevitável e indestrutível. Precisamos aprender a lidar com ele. Afinal, somente quando entendermos a razão do sofrimento é que poderemos viver plenamente, acolhendo a sua lição e transformando-o naquilo que sempre foi: fonte de vida.
Por outro lado, é curioso que Jesus tenha ressuscitado só ao terceiro dia da sua morte, conforme havia anunciado. Ora, não poderia ter sido diferente? Não poderia ter sido num outro tempo, antes ou depois dos três dias? Por quê, exatamente, três dias? Com certeza, a verdade total deste mistério nos escapa. Entretanto, sabemos que o número três é, na perspectiva das sagradas escrituras, um número perfeito e indicativo de totalidade; por isso mesmo, capaz de encerrar um período e fechar um ciclo. Deus sabe, mais do que ninguém, o quanto o sofrimento e a morte necessitam de um tempo de maturação dentro de nós, para que sejam devidamente compreendidos, assimilados e superados. Em outras palavras, é fundamental que possamos vivenciar o nosso luto, chorar nossas dores e saborear plenamente nossas emoções, mesmo as indesejáveis. Afinal, as lágrimas são tão importantes quanto o riso. E todos sabemos, por experiência própria, que o tempo é um remédio indispensável e insubstituível para curar muitos dos nossos males. Ele faz verdadeiros milagres. Sabe-se, hoje, que muitos casos de câncer, por exemplo, originam-se de lutos que não foram vivenciados, de sofrimentos que não foram assimilados, de um passado que não deixamos passar e que está sempre voltando para nós, consumindo-nos e fazendo-nos adoecer. Sendo assim, aceitar o imperativo do tempo, a experiência da dor, do sofrimento e da morte, é uma verdadeira bem-aventurança, uma ressurreição. Daí, talvez, possamos entender melhor a razão pela qual, só ao terceiro dia, o Cristo tenha ressuscitado.